terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Deixando para trás quem eu era

São apenas 4 meses que eu, minha esposa e nossa cachorrinha nos mudamos da capital do Brasil, Brasília, para a província de Manitoba em Winnipeg no Canadá. Mas não demorou muito para surgir um conflito enorme dentro de mim nessa "nova vida" que escolhemos para nós. Mas demorou muito para aceitar a realidade. Na verdade, ainda não consegui digerir 100% a ideia.

Quando você decide mudar de país, você precisa aceitar que a pessoa que você foi já não existe mais. Pode esquecer seus hábitos, seus gostos, seus diplomas. Tudo não fará mais parte de agora em diante. É um processo muito árduo de desapego.

Na segunda semana morando em Winnipeg eu fiz o 'Manitoba Start', que é um programa do governo para te inserir no mercado de trabalho e também te apresentar um pouco dos conceitos  dos canadenses. Foi bem ali, no primeiro dia que eu já percebi que a realidade seria bem árdua. Fiquei meio perdido quando entendi que minha formação no Brasil não me ajudaria de nada aqui. 

Sou formado em jornalismo com especialização em produção de televisão. Aqui, como no Brasil, a profissão jornalismo não é regulamentada, ou seja, você não precisa de um curso para exercê-la. No entanto, se você quer se arriscar a trabalhar em jornais, internet, televisão, seja a área que for, no mínimo você tem que ter um conhecimento da língua impecável. 

Durante o programa do governo, você faz diversos testes para tentar achar uma profissão, uma vaga no mercado de trabalho daqui, que se adeque com o seu perfil. Depois de 40 minutos, descobri que poderia escolher entre ser lojista, porteiro de hotel, cozinheiro ou lavador de louça. Não desmereço nenhuma dessas tarefas, até porque trabalhar é ter dignidade em qualquer lugar do mundo, e o que conhecemos como sub-emprego no Brasil, é o que faz a economia girar por aqui e torna o país exemplar.

Mas foi difícil dar adeus ao comunicador que eu tanto estudei para ser. Aqui, eu sou só mais um no meio de um monte de canadenses e imigrantes que estão tentando a vida. O fato de eu ter um blog com mais de 5 milhões de acessos, ter lançado livros, ter tido dezenas de experiências profissionais, nada conta. Ser o Rodolfo Poppi aqui é a mesma coisa que nada. Ninguém me conhece, ninguém conhece minha origem, ninguém se importa.

Luciana, minha esposa, era psicóloga no Brasil, digo 'era', porque para ela atuar como profissional aqui, teria que voltar a estudar por mais 8 anos no mínimo. Ou seja, nada do que ela fez até aqui tem validade no país, caso ela desejasse ser uma psicóloga clínica. 

Às vezes me pego pensando o quão difícil é querer ser entendido se a língua principal desse país não é a minha primeira língua. Por que uma coisa é você saber o idioma, outra coisa é você ser completamente fluente, no sentido não só de falar mas de pensar, incorporar as manias, hábitos, sotaque, gírias, métodos de construir um raciocínio.

Outro ponto que pega também é a divergência entre hábitos e personalidade que nós brasileiros temos que é difícil achar semelhantes ao redor do mundo. Tem vezes que nos pegamos sozinhos, porque temos colegas no trabalho e na escola, mas o estreitamento de laços é uma dificuldade. Nós brasileiros temos o costume de fazer amizade rápido, não demora muito e a nova pessoa já frequenta nossa casa e já está inserida no nosso circulo de amizades. Por aqui é muito difícil essa 'confiança' imediata. 

E obviamente o clima completamente diferente é um dos fatores que mais te fazem nostálgico da pessoa que você era. Cadê as caminhadas e corridas em um dia ensolarado? A cervejinha gelada no boteco com os amigos? Os pés molhados na areia da praia ou numa pedra de cachoeira... A realidade atual são várias camadas de roupa para sobreviver ao frio, e dependendo da sua vontade e coragem ir para rua tentar fazer algo.

São infinitas novidades que te fazem refletir e pensar em quem você era e sua disposição de desapegar de tudo isso para desfrutar 100% dessa nova experiência. Uma coisa  eu digo com toda a certeza do mundo; não é fácil!

É preciso ter claro o objetivo da mudança, todos os dias, para fazer valer a pena. E principalmente ter coragem de começar de novo, de construir seu nome mais uma vez, de descobrir o que você gosta ou não.

Aprender a não olhar para trás, essa é a grande chave do sucesso.



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Local: Winnipeg, MB, Canadá

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